A Supremacia Monetária que Moldou o Mundo
O dólar americano se tornou a moeda de referência global por meio de eventos como o colapso do padrão-ouro, os acordos de Bretton Woods e o “Nixon Shock”. Seu “privilégio exorbitante” permite aos EUA financiar déficits com custos reduzidos e atrair reservas internacionais.

O Dólar Americano
O dólar americano emergiu como a moeda de referência global não por acaso, mas através de uma complexa trama histórica que entrelaça poder econômico, decisões geopolíticas estratégicas e a consolidação dos Estados Unidos como a potência hegemônica mundial. Esta supremacia monetária, que persiste há mais de oito décadas, representa um dos pilares fundamentais da ordem econômica internacional contemporânea, conferindo aos Estados Unidos vantagens econômicas extraordinárias que economistas denominam de "privilégio exorbitante".[1][2]
A trajetória do dólar até sua posição atual de dominância mundial revela uma narrativa fascinante de transformações econômicas profundas, desde o colapso do padrão-ouro até a emergência de um sistema monetário internacional totalmente novo. Compreender esta evolução é essencial para decifrar não apenas como o mundo financeiro opera hoje, mas também para antever as mudanças que se aproximam no horizonte geopolítico global.[3][4]
Delegates at the 1944 Bretton Woods Conference establishing the post-war international monetary system.
As Raízes Históricas da Hegemonia Monetária Americana
Do Padrão-Ouro aos Acordos de Bretton Woods
A supremacia do dólar americano tem suas origens nas transformações econômicas do século XX, especialmente nas crises que abalaram o sistema monetário internacional baseado no padrão-ouro. O primeiro sistema monetário internacional moderno, conhecido como padrão-ouro clássico, vigorou de 1870 a 1914, período em que a Inglaterra era a potência econômica dominante e as demais nações alinhavam-se às diretrizes da política britânica para alcançar sucesso econômico.[5]
Sob o padrão-ouro, o regime monetário internacional era excepcionalmente estável em termos de taxas de câmbio, já que a adesão de um país ao sistema implicava converter sua moeda a uma quantidade pré-definida de ouro. Este regime manteve-se em funcionamento até julho de 1914, quando foi suspenso devido à Primeira Guerra Mundial. O período entre guerras, de 1929 a 1938, foi considerado uma época de "crise do capitalismo", com a produção industrial, o consumo e o emprego sofrendo quedas acentuadas que resultaram em grande perda econômica e empobrecimento sem precedentes.[3:1]
A Conferência de Bretton Woods: O Marco Decisivo
Em julho de 1944, representantes de 44 nações aliadas reuniram-se na cidade de Bretton Woods, em New Hampshire, para estabelecer as bases de um novo sistema monetário e financeiro internacional. Esta conferência histórica respondeu aos problemas decorrentes da década de 1930 e antecipou outros maiores ao fim da Segunda Guerra Mundial. O Sistema de Bretton Woods foi a última tentativa bem-sucedida de instituir regras gerais sistêmicas de organização do Sistema Financeiro Internacional.[3:2][6]
Os acordos estabeleceram princípios fundamentais que perdurariam por décadas: a definição do dólar americano como moeda padrão para transações internacionais, a indexação da taxa de câmbio entre o dólar e as demais moedas com limite de variação em bandas de 1%, e a criação de instituições multilaterais como o FMI e o Banco Mundial. Foi estipulado que o dólar seria o padrão monetário, e sua escolha deveu-se ao pressuposto de que apenas um país com grande reserva de ouro e com um comércio internacional superavitário poderia converter sua moeda em ouro.[7][8][3:3]
Evolução histórica da participação das principais moedas nas reservas cambiais mundiais, mostrando o domínio persistente do dólar americano
O Fim de Bretton Woods e a Consolidação do Poder do Dólar
O sistema durou até 15 de agosto de 1971, quando os Estados Unidos, de forma unilateral, acabaram com a convertibilidade do dólar em ouro, movimento conhecido como "Nixon Shock". Esta decisão radical colocou fim ao acordo de Bretton Woods, mas paradoxalmente fortaleceu ainda mais a posição do dólar como moeda internacional. Com a decisão de desvincular a moeda do ouro, o dólar permaneceu como câmbio para as moedas internacionais, enquanto as nações optavam pelo câmbio flutuante, sistema que permanece até hoje.[6:1][9]
A partir deste momento, o dólar tornou-se uma moeda fiduciária sem lastro em metal precioso, funcionando como moeda de reserva utilizada pelos países exclusivamente com base no poderio econômico e bélico dos Estados Unidos. Esta transformação marcou o início de uma nova era monetária internacional, onde a confiança na economia americana substituiu definitivamente o ouro como âncora do sistema financeiro global.[10]
O Privilégio Exorbitante: Vantagens da Supremacia Monetária
Definição e Origem do Conceito
O termo "privilégio exorbitante" foi cunhado pelo economista francês Valéry Giscard d'Estaing na década de 1960, quando criticou a posição de vantagem que os Estados Unidos detinham no sistema financeiro global devido ao status do dólar. Este privilégio refere-se à capacidade única dos Estados Unidos de emitir sua própria moeda para financiar déficits fiscais e comerciais, algo que nenhum outro país pode fazer da mesma forma.[1:1][11]
A dominância do dólar como reserva de valor remonta ao período do final da Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos, sendo a única nação grande que permanecia economicamente intacta, passou a ter a moeda que todos almejavam como reserva de valor. Mesmo após meio século do colapso do sistema de Bretton Woods, o dólar permaneceu como a moeda dominante no comércio internacional, reservas de bancos centrais e no financiamento global.[11:1][1:2]
Vantagens Econômicas Concretas
O privilégio exorbitante manifesta-se através de diversos benefícios econômicos tangíveis. Os Estados Unidos podem financiar seus déficits comerciais simplesmente emitindo dólares, uma vez que outros países aceitam essa moeda em troca de bens e serviços. Isso significa que os Estados Unidos podem consumir mais do que produzem sem enfrentar a necessidade imediata de ajustar suas contas externas, já que a demanda por dólares é constante.[1:3]
A confiança global no dólar permite que os Estados Unidos tomem empréstimos a taxas de juros mais baixas do que outras nações. Investidores de todo o mundo compram títulos do governo americano, e por valorizarem a conveniência e segurança de tais títulos, aceitam pagar mais por eles, o que equivale a aceitar retornos menores. Com isso, o governo americano consegue se financiar a um custo mais baixo, e em momentos de crise global, o custo de financiamento dos Estados Unidos tipicamente diminui, dado o status de "porto seguro" da moeda americana.[11:2][1:4]
A Senhoriagem Internacional
A senhoriagem representa outro aspecto crucial do privilégio exorbitante. Definida como o lucro do governo derivado da emissão de moeda, a senhoriagem pode ser uma fonte de receita conveniente para um governo. No contexto internacional, alega-se frequentemente que os Estados Unidos recebem uma significativa "receita de senhoriagem" por ser o dólar usado como principal reserva em todo o mundo.[12][13]
Os dólares que os Estados Unidos enviam para o resto do mundo ao importar bens e serviços não desaparecem - eles voltam em forma de investimento. Investidores estrangeiros, sejam bancos centrais, fundos soberanos, empresas ou indivíduos, compram ativos americanos: títulos do Tesouro, ações, imóveis, startups. O mundo quer guardar riqueza em dólar, criando uma dinâmica única onde o déficit comercial dos Estados Unidos gera os dólares que o resto do planeta deseja manter.[14]
Ranking das cinco maiores economias mundiais em 2024, destacando a supremacia econômica dos Estados Unidos
A Infraestrutura do Poder Monetário Global
O Sistema SWIFT: A Espinha Dorsal das Transações Internacionais
O sistema SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication) representa uma das infraestruturas mais críticas que sustentam a supremacia do dólar. Fundado em 1973 em Bruxelas, este sistema é usado por mais de 11.000 organizações bancárias e de valores mobiliários, infraestruturas de mercado e clientes corporativos em mais de 200 países e territórios.[15][16]
A maioria das transações interbancárias internacionais, como ordens de pagamento e transferências bancárias, são realizadas por meio da rede SWIFT. Esta rede permite a troca de mensagens eletrônicas em um meio altamente seguro, onde cada banco possui um endereço próprio (código SWIFT, ou BIC). O domínio do dólar neste sistema é esmagador: a moeda americana está envolvida em quase 90% de todas as transações no mercado de câmbio de US$ 7,5 trilhões por dia.[16:1][17]
O Papel dos Petrodólares
O sistema dos petrodólares, estabelecido através do acordo entre Estados Unidos e Arábia Saudita em 1974, representou outro pilar fundamental da supremacia do dólar. O termo "petrodólares" refere-se aos dólares norte-americanos recebidos pelos países exportadores de petróleo através da venda da commodity. Este acordo tácito entre os dois países consolidou a hegemonia econômica dos Estados Unidos e a atratividade de seus títulos.[18]
Durante 50 anos, a principal commodity do planeta foi negociada por uma moeda que só os Estados Unidos tinham autoridade de emitir, obrigando todos os países a aceitar o efeito disso no preço do petróleo. A ligação com o petróleo ajudou a naturalizar o dólar como referência global, fazendo com que a moeda norte-americana passasse a ter papel mais importante nas reservas monetárias mundiais e em transações comerciais de vários outros produtos.[18:1]
A Supremacia nos Mercados Financeiros
O domínio do dólar é ainda maior nos mercados financeiros globais. Em torno de 60% dos empréstimos e depósitos internacionais são feitos em dólar, e 70% das emissões de títulos também ocorrem nesta moeda. No câmbio, o dólar aparece em 88% de todas as transações, e até o dinheiro em espécie reflete esse protagonismo: de todos os dólares em papel que circulam no mundo, cerca da metade está fora dos Estados Unidos.[19]
Os preços de commodities globais, incluindo petróleo, ouro e produtos agrícolas, são tradicionalmente cotados em dólares, criando uma demanda estrutural pela moeda americana que transcende as necessidades comerciais bilaterais. Esta prática força países importadores a manter reservas substanciais em dólares, alimentando continuamente a demanda pela moeda e reforçando sua posição dominante.[20][21]
Various denominations of United States dollar bills displayed on a wooden surface, illustrating the familiar physical form of the US currency.
A Economia Americana: Sustentáculo da Supremacia Monetária
Dimensões da Maior Economia Mundial
Os Estados Unidos mantêm sua posição como a maior economia do mundo, com um PIB de US$ 29,18 trilhões em 2024, representando 26,5% da economia global. Esta dimensão econômica colossal sustenta a confiança internacional no dólar e justifica sua utilização como moeda de referência. A economia americana é caracterizada por sua grande diversidade e dinamismo, com setores robustos como tecnologia, manufatura, serviços financeiros e consumo.[22][23][24]
O PIB per capita americano, de US$ 66.683 em 2024, coloca o país entre os mais altos globalmente, demonstrando não apenas o tamanho absoluto da economia, mas também sua produtividade e padrão de vida. Esta combinação de escala e eficiência econômica cria um ambiente atrativo para investidores internacionais, que veem nos ativos denominados em dólares uma forma segura de preservar e multiplicar capital.[23:1]
O Papel do Federal Reserve
O Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, desempenha papel crucial na manutenção da força do dólar através de suas políticas monetárias. Com um duplo mandato de manter a inflação baixa e buscar o pleno emprego, o Fed regula as taxas de juros e implementa políticas como a flexibilização quantitativa para controlar a inflação e promover o crescimento econômico.[22:1][25]
Suas decisões são monitoradas de perto pelos mercados financeiros globais e têm impacto significativo no valor do dólar. A taxa básica de juros, atualmente mantida entre 4,25% e 4,50%, serve como referência para taxas internacionais e influencia fluxos de capital globais. A credibilidade e independência do Fed contribuem significativamente para a confiança internacional no dólar como reserva de valor.[26][27]
Desafios Fiscais Crescentes
Apesar da posição dominante, a economia americana enfrenta desafios fiscais significativos. A dívida pública total atingiu US$ 36,2 trilhões em 2024, equivalente a 120% do PIB, um nível recorde histórico. Esta dívida representa uma preocupação crescente para os mercados financeiros, especialmente considerando que os pagamentos de juros da dívida nacional já consomem US$ 881 bilhões anualmente, equivalente a 3,2% do PIB.[28][29][30]
O déficit orçamentário de US$ 1,8 trilhão em 2024, representando 6,4% do PIB, indica uma trajetória fiscal insustentável a longo prazo. Desde o ano fiscal de 2002, a economia americana registra déficits orçamentários anuais consecutivos, totalizando 23 anos de déficit até 2024. Esta situação levanta questões sobre a sustentabilidade a longo prazo do privilégio exorbitante e da confiança internacional no dólar.[23:2][30:1]
Desafios à Supremacia do Dólar
A Emergência de Alternativas: BRICS e Desdolarização
Os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, além dos novos membros) têm intensificado discussões sobre alternativas ao dólar em suas transações comerciais. Esta movimentação ganhou força especialmente após as sanções impostas à Rússia em 2022, que demonstraram os riscos da dependência excessiva do sistema financeiro dominado pelo dólar.[31][32]
O objetivo não é substituir o dólar completamente, mas criar alternativas dentro da ordem monetária vigente, ampliando a diversidade de moedas utilizadas no comércio internacional. Iniciativas como acordos de swap cambial entre Brasil e China, que permitem transações sem usar o dólar como intermediário, representam passos concretos nesta direção.[32:1][31:1]
O Avanço do Yuan Chinês
A China, como segunda maior economia mundial com PIB de US$ 18,27 trilhões, tem promovido crescentemente o uso do yuan nas transações internacionais. O país desenvolveu o CIPS (Cross-Border Interbank Payment System), sistema de pagamentos apoiado pelo Banco do Povo da China, que oferece serviços de compensação e liquidação em pagamentos e comércio entre países em renminbi.[33][34]
Apesar destes esforços, o yuan ainda representa apenas cerca de 2,8% das reservas cambiais mundiais, comparado aos 58,36% do dólar. A participação limitada reflete, em parte, os controles de capital ainda existentes na China e a preferência dos mercados por ativos mais líquidos e transparentes.[35]
Criptomoedas e Inovações Tecnológicas
O surgimento de criptomoedas, especialmente o Bitcoin, representa outro desafio potencial ao sistema monetário tradicional baseado no dólar. Com capitalização de mercado superior a US$ 2 trilhões, o Bitcoin demonstra a demanda por alternativas descentralizadas ao sistema financeiro tradicional.[36][37]
Embora ainda voláteis e regulamentados de forma inconsistente globalmente, as criptomoedas oferecem possibilidades de transações internacionais que contornam completamente o sistema bancário tradicional e, consequentemente, a necessidade de usar dólares como moeda intermediária.[38][36:1]
The Federal Reserve building in Washington, D.C., symbolizes the authority of the US central bank over the global dollar currency.
O Declínio Gradual mas Persistente
Dados Históricos da Erosão
Os dados históricos revelam um declínio gradual, mas consistente, da participação do dólar nas reservas cambiais mundiais. De um pico de 84,85% em 1970, a participação caiu para 58,36% em 2022, representando uma diminuição de 26,5 pontos percentuais ao longo de cinco décadas. Esta tendência de queda intensificou-se nas últimas duas décadas, com a participação do dólar caindo abaixo de 59% no último trimestre de 2022.[35:1][39]
A redução não foi acompanhada por aumentos proporcionais nas outras moedas de reserva tradicionais como euro, iene e libra esterlina. Em vez disso, observa-se uma diversificação crescente em direção a moedas de economias menores que tradicionalmente não figuravam de forma proeminente nas carteiras de reservas.[35:2]
Fatores Estruturais de Mudança
Diversos fatores estruturais contribuem para esta erosão gradual. O movimento do centro de gravidade econômico do Ocidente para o Oriente, as complexidades da política interna dos Estados Unidos, o crescente poder de projeção internacional da China e a assertividade internacional dos países do Sul Global têm limitado progressivamente a supremacia do dólar.[40]
A utilização do sistema financeiro como arma geopolítica, através de sanções e exclusões do sistema SWIFT, tem acelerado a busca por alternativas por parte de países que temem ser alvos de medidas similares no futuro. Esta "weaponização" do dólar pode estar minando ironicamente sua própria posição dominante a longo prazo.[41][42]
Implicações Futuras e Cenários Prospectivos
Manutenção da Dominância a Médio Prazo
Apesar dos desafios crescentes, especialistas concordam que o dólar manterá sua posição dominante no médio prazo devido à ausência de alternativas verdadeiramente viáveis. A frase de Larry Summers ilustra esta realidade: "A Europa é um museu, o Japão é um asilo e a China é uma prisão". Esta caracterização captura os problemas fundamentais das principais alternativas: baixo crescimento na Europa e Japão, e controles de capital na China.[11:3][17:1]
O status do dólar se desenvolveu ao longo de décadas e é sustentado pelo mercado profundo e líquido de títulos do Tesouro dos Estados Unidos, pela estabilidade institucional americana e pela ampla aceitação da moeda. Quebrar esta inércia institucional e de mercado requereria mudanças estruturais profundas que demorariam décadas para se materializar.[17:2]
Cenários de Transformação Gradual
O cenário mais provável envolve uma erosão gradual e contínua da supremacia do dólar, sem um colapso abrupto. Esta transição poderia levar a um sistema monetário internacional mais multipolar, onde o dólar mantém uma posição de destaque, mas compartilha espaço com outras moedas regionais e globais.[4:1][40:1]
Tal evolução poderia resultar em maior estabilidade global, reduzindo a dependência excessiva de uma única moeda e economia nacional. Por outro lado, também poderia aumentar a complexidade e os custos das transações internacionais, pelo menos durante o período de transição.[41:1]
Impactos para a Economia Global
A eventual perda da supremacia absoluta do dólar teria consequências profundas para a economia global. Os Estados Unidos perderiam gradualmente seu privilégio exorbitante, enfrentando custos de financiamento mais altos e a necessidade de ajustes mais rigorosos em suas contas externas.[1:5][41:2]
Para outros países, especialmente economias emergentes, uma maior diversificação monetária poderia oferecer mais opções de financiamento e menor exposição às políticas monetárias americanas. Contudo, também poderia resultar em maior volatilidade cambial e complexidade na gestão de reservas internacionais.[31:2][41:3]
Conclusão: A Persistência de um Poder Único
A supremacia do dólar americano como moeda de referência global representa um fenômeno histórico extraordinário, construído através de uma combinação única de poder econômico, decisões geopolíticas estratégicas e circunstâncias históricas favoráveis. Desde os Acordos de Bretton Woods em 1944, esta posição dominante conferiu aos Estados Unidos vantagens econômicas imensas, permitindo ao país financiar déficits persistentes, tomar empréstimos a custos reduzidos e exercer influência geopolítica através do controle do sistema financeiro internacional.[1:6][3:4][4:2]
O "privilégio exorbitante" do dólar manifesta-se através de múltiplas dimensões: a senhoriagem internacional, o acesso privilegiado aos mercados de capitais globais, a capacidade de financiar déficits sem ajustes imediatos e o poder de influenciar políticas econômicas mundiais através das decisões do Federal Reserve. Esta supremacia é sustentada por uma infraestrutura institucional robusta, incluindo o sistema SWIFT, o mercado de petrodólares e a profundidade incomparável dos mercados financeiros americanos.[12:1][13:1][15:1][16:2][18:2][1:7]
Contudo, os dados históricos revelam uma erosão gradual mas persistente desta dominância. A participação do dólar nas reservas cambiais mundiais caiu de 84,85% em 1970 para 58,36% em 2022, refletindo mudanças estruturais na economia global. A emergência de economias como a China, iniciativas de desdolarização dos BRICS, inovações tecnológicas como as criptomoedas e a crescente utilização do sistema financeiro como arma geopolítica representam desafios crescentes à hegemonia monetária americana.[31:3][33:1][35:3][36:2][39:1][41:4]
Apesar destes desafios, a manutenção da supremacia do dólar no médio prazo parece provável devido à ausência de alternativas verdadeiramente viáveis. A combinação de tamanho econômico, estabilidade institucional, profundidade de mercados financeiros e ampla aceitação internacional confere ao dólar vantagens competitivas que outras moedas ainda não conseguem igualar. A própria inércia do sistema financeiro internacional, construída ao longo de décadas, funciona como uma barreira natural à mudança rápida.[11:4][17:3][22:2]
O futuro mais provável envolve uma transição gradual para um sistema monetário internacional mais multipolar, onde o dólar mantém posição de destaque mas compartilha espaço com outras moedas regionais e globais. Esta evolução, embora lenta, terá implicações profundas tanto para os Estados Unidos quanto para a economia global, potencialmente resultando em maior estabilidade sistêmica, mas também em maior complexidade transacional e custos de adaptação.[4:3][40:2][41:5]
A história do dólar como moeda de referência global ilustra como poder econômico, decisões políticas e circunstâncias históricas podem criar estruturas institucionais duradouras que moldam a ordem econômica internacional por décadas. Compreender esta trajetória é essencial não apenas para interpretar o presente, mas também para antecipar as transformações que definirão o futuro do sistema monetário internacional. A supremacia do dólar, construída através de oito décadas de hegemonia americana, continuará a influenciar as relações econômicas globais, mesmo que em formato gradualmente modificado pelas realidades geopolíticas e econômicas do século XXI.
https://tede2.pucsp.br/bitstream/handle/9141/1/Paulo Roberto da Silva.pdf ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.cnnbrasil.com.br/economia/financas/50-anos-pos-bretton-woods-dolar-ainda-reina-em-meio-a-febre-de-criptomoedas/ ↩︎
https://www.imf.org/pt/Blogs/Articles/2022/06/01/blog-dollar-dominance-and-the-rise-of-nontraditional-reserve-currencies ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.uesc.br/dcec/pedrolopes/artigo_prof_pedro_lopes_sistema_monetario.pdf ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://veja.abril.com.br/economia/fim-da-era-do-dolar-mercado-comeca-a-apontar-os-limites-da-moeda-americana/ ↩︎ ↩︎
https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/direito/o-sistema-monetario-internacional.htm ↩︎
https://www.scielo.br/j/rep/a/JRs9pbMWG9WhDgBkRNRFdmp/?lang=pt ↩︎
https://blog.ibmec.br/web-stories/por-que-o-dolar-e-a-moeda-internacional-como-foi-decidido/ ↩︎
https://artica.capital/cartas/breve-historia-do-sistema-monetario/ ↩︎
https://www.suno.com.br/artigos/bretton-woods/ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_Monetário_Internacional ↩︎ ↩︎
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dólar_dos_Estados_Unidos ↩︎ ↩︎
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/ecos/article/download/8643208/10756/15367 ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.ufrgs.br/fce/wp-content/uploads/2017/02/TD05_2003_dathein.pdf ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.nexojornal.com.br/grafico/2025/04/01/dolar-americano-participacao-reservas-internacionais-grafico ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://bibliotecadigital.economia.gov.br/bitstream/123456789/624/1/As Transformações no Sistema Monetário Internacional - Cintra et alli - 2013.pdf ↩︎
https://conteudos.xpi.com.br/guia-de-investimentos/relatorios/o-privilegio-exorbitante-dos-eua-o-cristal-trincou/ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/Mono_23.2_Felipe_de_Souza_Jatahy.pdf ↩︎
https://www.eco.unicamp.br/images/arquivos/artigos/541/01-wray.pdf ↩︎
https://www.jb.com.br/pais/opiniao/artigos/2023/04/1043469-o-privilegio-exorbitante-do-dolar-americano-permanece.html ↩︎
https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/e-se-odolar-deixar-de-ser-a-moeda-global/ ↩︎
https://www.cnnbrasil.com.br/economia/com-pec-da-autonomia-financeira-bc-teria-mais-recurso-para-gastar-em-ano-de-inflacao-alta/ ↩︎
https://cartadocondado.substack.com/p/voce-conhece-o-privilegio-exorbitante ↩︎
https://www.bloomberglinea.com.br/2025/03/27/o-dolar-e-excepcional-e-seu-dominio-continua-solido-goste-se-ou-nao/ ↩︎ ↩︎
https://www.excedente.org/wp-content/uploads/2014/11/03-Serrano.pdf ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.travessa.com.br/privilegio-exorbitante-a-ascencao-e-queda-do-dolar-e-o-futuro-do-sistema-monetario-internacional/artigo/e81e5690-b801-4a1c-a0b2-e908677ea449 ↩︎ ↩︎
https://www.piqueniqueseguros.com.br/post/euro-ou-dolar-qual-e-mais-forte ↩︎ ↩︎
https://www.econ.puc-rio.br/mgarcia/190625_MacroIIParteIII.pdf ↩︎
https://www.ion.itau/news/o-dolar-e-seus-descontentes/ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.anpec.org.br/encontro/2024/submissao/files_I/i7-b3022e34c933ef57ec00f8a685832139.pdf ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://revistas.uece.br/index.php/tensoesmundiais/article/download/713/597/2553 ↩︎
https://eleuterioprado.blog/2025/07/08/fim-do-privilegio-exorbitante-da-america/ ↩︎
https://www.reddit.com/r/AskEconomics/comments/1gtez2v/so_what_are_the_advantages_and_disadvantages_of/?tl=pt-br ↩︎ ↩︎
https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/257019 ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/rita-mundim/economia/macroeconomia/mundim-china-tem-intencao-de-substituir-dolar-e-preocupa-trump/ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎ ↩︎
https://investidor10.com.br/criptomoedas/bitcoin-international/ ↩︎